20/04/2023 às 12:20 Entrevistas

Entrevista com Marcos Kleine (Ultraje a Rigor)

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Marcos Kleine é guitarrista do Ultraje a Rigor e foi o primeiro baterista do Viper. Conversei com ele sobre o atual momento de carreira e como é participar do programa The Noite, apresentado por Danilo Gentili. Boa leitura!

O Ultraje a Rigor vai fazer show em Curitiba. Quais as expectativas? Por que a banda não faz tanto show?

É opcional. O Roger não quer viajar tanto mais. Ele tem duas filhas e quer cuidar mais da família. Além disso, temos o programa The Noite, que cria uma tranquilidade musical e artística para a gente. Não tocamos em Curitiba já tem dez anos. Lembro do último show que fiz lá. Gosto da cidade, tenho amigos lá. Tem muito palmeirense! [risos]. Estamos felizes de poder fazer o show. Terão todos os hits que os fãs querem ouvir. Não tem aquilo de tocar música nova e tirar as antigas. Vamos com os sucessos e também com o que pedirem. Adoro o clima frio de Curitiba, que todo curitibano reclama! Vou só com uma blusinha! [risos]. É um show para se divertir.

Como foi sua entrada no Ultraje a Rigor?

Foi uma sucessão de coisas. Primeiro, conheci o Mingau, antes de ele entrar no Ultraje. Eu estava gravando o disco da minha banda Exhort chamado ‘p.r.a.Y’, que foi aclamado pela crítica. Pedi um amplificador emprestado e não sei como o Mingau apareceu no estúdio! Ficamos muito amigos. Depois de um tempo, montamos a Vega juntos, que era uma banda pop com vocal feminino. Tivemos essa banda por um tempo e nesse período ele entrou no Ultraje. Isso foi em 1998. Ele ficou dividido e eu rondando ali. Depois de um tempo, começamos a tocar juntos com o Léo Jaime. Tocamos muito assim e nesse meio tempo rolou um projeto de rock anos 1980 da Multishow. Nós éramos a banda fixa do show. Tocávamos com todo mundo e inevitavelmente conheci o Roger. Na hora rolou amizade! Ele é geek como eu. Meio nerd, gosta de falar de séries e tal. Esse foi meu primeiro contato. Em 2005, o Roger montou a Fabulosa Orquestra de Rock ‘n’ Roll, que era uma big band com quatro vocalistas para tocar lado B do rock anos 1950. Eu e Mingau estávamos juntos e foi aí que estreitei relações com o Roger. Em 2008, o guitarrista do Ultraje não conseguiu fazer um show e acabei substituindo. Eu sabia tocar só cinco músicas e precisei tirar outras vinte! Deu tudo certo e o Sérgio Serra resolveu sair da banda. Meu nome obviamente foi ventilado. Tinha o Yahoo Grupos na época e acordei com várias mensagens lá sobre a possibilidade. Eu estava próximo do Roger e do Mingau e naturalmente entrei. A princípio eu era convidado. Essa formação do Ultraje é a mais longeva da história da banda.

Como é dividir as guitarras com o Roger?

O Roger é um guitarrista super bom. Ele tem um ritmo excelente e está solando bem para caramba. Nunca conversamos sobre quais partes cada um vai tocar. Falei para ele não se preocupar com isso. A banda é sua, faz o que quiser! Pode solar onde quiser, de boas. Nunca tivemos um ensaio de guitarras. Na verdade, ensaiei umas duas vezes com o Ultraje. Uma vez com o Erasmo Carlos para tocar no Rock in Rio e uma vez para o disco ‘Por que Ultraje a Rigor?, Vol. 2’. Sempre foi super natural isso.

O último disco de estúdio foi justamente esse. Como foi essa experiência? Ele foi lançado só em streaming, né?

Sim! Sabe como foi a gravação? Entramos no estúdio, afinamos e tocamos! Se alguém errou, volta. Não tem overdub nenhum. É um disco ao vivo mesmo. Nunca gravei um disco ao vivo tão ao vivo na minha vida! Não tem nada regravado. Chegamos 12h no estúdio e saímos umas 20h com os dedos esfolados e acabou. Mixamos e lançamos. Ouvi ele pronto depois. Já tocávamos essas músicas no programa The Noite. Fizemos umas versões diferentes. Antes desse, gravei o ‘Ultraje x Raimundos’. Foi muito bom também. A ideia desse último era ser ó streaming mesmo, tanto que a capa é nós olhando para o celular.

Como foi gravar o álbum “Embate do Século” com os Raimundos?

Esse trampo foi muito legal. Fomos no estúdio gravar todo final de semana durante um mês. Inventamos os arranjos na hora. Todos conversaram e fomos gravando. Não sei como foi o processo do Raimundos, mas o acordo era que ninguém ia ouvir as versões dos outros. Só um dia antes do lançamento nós ouvimos o que eles fizeram. Foi uma expectativa muito legal! Acho esse disco orgânico, porque estávamos juntos lá. Foi um clima legal com muitas zoeiras e piadas.

Você sempre curtiu o Raimundos?

Sempre curti. Uma vez fui tocar em um Skol Rock e o Raimundos ia fechar. Eu estava com uma banda e ficamos em último lugar! [risos]. Mas eu lembro dos caras. Era na época do Rodolfo. Agora, eu os via de vez em quando. Uma vez, tocamos num festival com o Raimundos e o Velhas Virgens. Lembro que atrasou para caramba. Eu sempre cruzei com eles. Recentemente, o Rodolfo foi no The Noite. O Raimundos já foi também lá. Aliás, uma tristeza o que aconteceu com o Canisso. Eles são legais e talentosos. Curto muito o som deles. Na época que gravei o ‘p.r.a.Y’, do Exhort, eles estavam dividindo o estúdio com a gente. O produtor era o Miranda. Foi meu primeiro contato com eles. Não sabia que eles iriam ser quem se tornaram.

Como foi se apresentar no Rock in Rio em 2015 com o Erasmo Carlos?

O Erasmo Carlos convidou o Ultraje a Rigor para o Palco Sunset. Não sei se já bateram o recorde, mas lembro que foi o recorde de público desse palco! Foi sensacional dividir o palco com ele. Nós ensaiamos juntos, tudo foi ótimo. Não tem o que falar! O final de semana foi maravilhoso. O show estava com um grande astral. É esquisito você acordar cedo e tomar café da manhã pensando que daqui a pouquinho vou fazer o show da minha vida! Tocar lá é sensacional, tem família assistindo e tudo. Finalmente o Multishow passou um show nosso. Nós somos do SBT então eles evitam. Nunca fomos muito transmitidos pela Globo por concorrência. Agora, aquele foi um dos shows mais legais da minha vida. Eu precisava tocar no Rock in Rio. Era um objetivo meu para fechar a lista. Abri o Rolling Stones e toquei no Rock in Rio.

Como surgiu o convite para trabalhar com o Danilo Gentili?

Começamos no “Agora é Tarde” em 2011. O Roger sempre foi fã desse formato de programa de talk show. Eu não assistia muito, mas achava legal. O Danilo e o Alex, que foi redator chefe dele, estavam com essa ideia do programa. O Danilo estava estourado por causa do CQC. Ele pensou que a banda perfeita seria o Ultraje. Esse convite chegou no Roger, eles tiveram uma reunião e ele adorou a ideia. Fizemos um piloto na Band e assinamos contrato. Em 2013 saímos da Band e fomos para o SBT. Foi uma ideia do Danilo e do Alex. O Roger teve uma grande visão de ver que isso ia ser algo ótimo. É um clima muito legal lá. Se os bastidores fossem gravados, estaríamos na cadeia! [risos]. Todos se gostam muito.

Tem algum convidado que você ficou muito nervoso?

Não diria nervoso, mas é muito legal às vezes. Lembro quando foi o Patrick Stewart e o James McAvoy para divulgar o filme do X-Men. Era o Professor Xavier careca e com cabelo! [risos]. Eu sou fã de Star Trek, então foi ótimo ver eles lá. Me chamaram no camarim e o Patrick disse: ‘Você é o Treker do programa então?’. Eu falei uma citação de uma frase dele em Star Trek e ele deu risada. Outro que foi muito legal foi o Jon Anderson, do Yes. Tocamos com ele. Fizemos um musical e na volta do bloco tocamos ‘Rhythm of Love’ e ele saiu cantando, foi demais. Outro que foi legal foi o Hugh Jackman. Também foi legal quando foi o Naveen Andrews, que fazia o Sayid do Lost. Foi louco porque saímos tocando um som pesado e ele disse que adora punk rock e toca guitarra. Tocamos Sex Pistols juntos no final! Foi tudo improvisado na hora.

Você é muito ligado em política igual o Roger?

Eu já comentei demais sobre isso. Todos nós do Ultraje a Rigor pensamos da mesma forma. Agora, é complicado falar de política no Brasil. Vemos um quadro que bate um desânimo puro. Evito falar porque não adianta nada. Nunca fiz campanha para político ferrenhamente. Eu odeio o PT e isso é notório, não é segredo para ninguém. Detesto por razões óbvias. Eu quero um país melhor e esses caras não trazem solução para nada. Ficaram 30 anos no poder, voltaram agora e é uma desgraça. O tempo vai dizer. Eu faço meu rolê. Já perdi muito trabalho por causa de política. Pode votar em quem você quiser. Eu quero sossego, não vou ficar brigando por político nenhum. Mereciam todos a lata do lixo. Não vou ficar discutindo com um moleque de 15 anos que não arruma a cama e acha que entende de política.

Como foi viver o rock nacional dos anos 1980?

Eu cresci com o pessoal do Viper. São meus amigos de infância. Éramos mais metaleiros. Era uma época tão rica musicalmente que tínhamos até o direito de não gostar de algumas bandas nacionais por achar brega ou ser muito colorido. Hoje, vemos que era genial. É coisa de moleque. Lembro de estar na casa do Felipe Machado e com o Pit Passarell e assistir ao Rock in Rio 1985! Era uma época muito rica e ficávamos assistindo videoclipes. Lembro quando descobri o Yngwie Malmsteen. Eu e o Felipe fomos na Galeria do Rock comprar o ‘Rising Force’ de presente para o Pit. Só que não resistimos e começamos a ouvir! [risos]. Não queríamos dar o disco para ele. Nós nos reuníamos para ouvir música. Antes do Viper, quando eu tinha 13 anos, mudei para um prédio onde o Cassio Audi morava. Ele foi baterista do Viper depois. Ele tinha instrumentos de marcenaria, fez aquele baixo de machado do Gene Simmons. Eu era fã do Kiss já. Ficamos amigos e nos pintávamos de Kiss. Fizemos aquela Flying V também. Ficamos famosos no bairro por causa disso! Fomos convidados para ir no programa do Wandeko Pipoca em 1983. Dublávamos Kiss e passávamos Hipoglós na cara! Nós fedíamos! [risos]. Nessa ocasião, eu fui como Gene Simmons, o Cassio era o Paul Stanley. O Nando Machado era o Peter Criss e o Andre Matos era o Vinnie Vincent por causa do cabelo! Pena que não tem fotos ou vídeos disso. Lembro que o Wandeko disse que no final do programa nós iriámos aparecer sem máscara. Apareci com uma chuquinha e uma corrente de bicicleta no pescoço!

Você sempre foi muito próximo do Andre Matos, né?

Perto desse prédio que eu fui morar vivia todo o pessoal do Viper. No do lado, morava o Andre Matos. A primeira banda que tive na vida foi o Netuno. Era eu, Andre e o Yves Passarell. Eu fui o primeiro baterista do Viper! Antes, no Netuno, fizemos até sessão de fotos! Tocávamos ‘Run to the Hills’ e ‘Eva’. Eu morava em apartamento e seria difícil ter uma bateria de verdade. A coisa não andava. Desisti da bateria e o Cassio entrou no Viper. Sempre digo que o Viper nasceu no dia do meu aniversário em 1985. Eu dei uma festa na minha casa e o Andre Matos foi convidado para entrar no Viper nessa festa de aniversário. Ele ficou preocupado por causa do Netuno, mas eu falei que não tinha problema nenhum. Ele podia ficar tranquilo. Ele era muito educado e preocupado. Éramos moleques e ele começou a ensaiar com o Viper. Eu fiquei sem saber o que fazer e o Felipe chegou para mim em 10 de março de 1985 e disse: ‘Por que você não começa a tocar guitarra?’. Ele me deu uma guitarra para segurar e achei ótimo. Comecei a correr atrás para tocar. Virei roadie do Viper no começo. Minha relação com o Andre sempre foi de amigos. Sempre torci para dar certo. Lembro uma vez que fui entregar pizza para tentar comprar minha primeira guitarra. Quem veio entregar junto? Yves, Pit e Andre! Eles não duraram muito. Tem uma história curiosa de quando o Pit foi entregar pizza em um prédio que o zelador era o João Gordo! São histórias que dá para virar um livro. Depois que o Andre entrou no Angra perdemos um pouco o contato. Nos víamos às vezes, mas sempre foi legal lembrar dessas besteiras que fazíamos.

Você gostava do trabalho dele no Angra?

Eu acho o trabalho dele excelente. Todos eles são muito bons músicos e as músicas são bem legais. Agora, eu acompanhava distante. Não sou muito fã do estilo, né? Não tenho muita lógica para meus gostos musicais. Posso ouvir Seal e depois Metallica. Não tenho muita fronteira. Depois que você começa a trabalhar muito com música, começa a parar de ouvir. Hoje, não pego e vou ouvir o disco novo de sei lá quem. Quero jogar PlayStation.

O novo do Metallica saiu agora!

Vou ouvir de curiosidade no carro, mas não vou ficar voltando a mesma música duzentas vezes como era antigamente. Quando gravamos o The Noite, ficamos o dia inteiro lá e é alto demais. Chego em casa e quero ver programa de esporte ou culinária. Agora, sem dúvidas, tudo que o Andre fez foi de qualidade. Ele sempre manteve um nível artístico bizarro, tanto que virou um ícone da música. Ele tocava piano muito bem também.

E o Yves, você acompanhou no Capital Inicial?

Sim, nos encontramos às vezes fazendo show e eu converso de vez em quando com ele. Hoje, o mundo está na correria. Todo com família, então é difícil parar para encontrar. Sempre converso com ele porque ele é palmeirense! Temos essa ligação futebolística. Fico muito feliz por ele. Acompanho ele desde moleque e vi o esforço que ele empenhou. Ele sempre foi um ótimo guitarrista e foi legal ver que ele trilhou e achou seu lugar no Capital. Eu estou feliz que toquei uma vez no Rock in Rio e o desgraçado já tocou umas dez! [risos].

O rock hoje em dia não está na crista da onda da mídia. Como você vê o cenário atual do rock no Brasil?

Eu não tenho a resposta perfeita, mas acho que existem diversos fatores. O rock perdeu a identidade um pouco. Ele foi muito para o lado de a produção musical ficar acima do que os artistas estão pensando. Outro fator é que a música hoje em dia está relacionada a um rolê. O cara vai no show do sertanejo pelo combo: vai ter mulher e aquela atmosfera. A música vira um acessório para unir as pessoas. Antes, você ia no show para ver o cara tocar. Queríamos ver como era ao vivo a música. Era pela banda e pela pegada, letra e atitude. O mundo mudou e o rock não acompanhou isso do rolê. Você vai no show do rock para ver a banda e ir embora. Nos outros estilos, existem mais atrativos.

Tipo o show do Coldplay, né?

Isso. Eles fizeram sete shows no Morumbi! Eles estão ligados que o rolê é outro hoje em dia. Obviamente, a democratização da música nos streamings tornou a coisa meio confusa. Para você fazer uma seleção musical é mais difícil. Qual banda é boa? Isso as gravadoras foram legais, elas filtravam muito. Se você pega as bandas icônicas de gravadoras antigas, elas realmente eram fodas. Acaba desanimando as próprias bandas. Vira uma troca de energia errada. Tem muita banda boa, mas eles tocam em boteco e não ganham grana. Aí, acabam, mas se tivesse um impulso seria diferente. A rádio e a novela não têm o mesmo peso também. Tudo mudou e o rock ficou meio para trás nesse sentido midiático. Ninguém sabe muito o que fazer. Pode ser que o rock volte, precisamos de uns craques aparecendo. Li outra vez que os produtores estão usando a técnica dos sete segundos. A cada sete segundos alguma coisa tem que acontecer na música para prender a atenção da galera. Todos são muito dispersos. O cara está tocando guitarra e tem o WhatsApp e tudo mais. É fácil sair do foco.

Quais são os 5 álbuns que mais te marcaram?

O ‘Creatures of the Night’, do Kiss, que me remete a coisas maravilhosas. Era um tempo legal. O ‘Master of Puppets’ do Metallica e o ‘Blizzard of Ozz’ do Ozzy Osbourne. Conheci o Randy Rhoads aí. Esse guitarrista me inspira absurdamente. Gostava muito do ‘Dynasty’ do Kiss. É um disco meio nada a ver, né? Ninguém está nem aí, mas eu amava. Também o compacto com o hino do Palmeiras tocada pelos bombeiros de São Paulo! [risos].

E de rock nacional, algum te marcou mais?

Ultraje a Rigor com certeza. O disco ‘Nós Vamos Invadir Sua Praia’. Não é porque sou da banda agora. Meu irmão brincava com o baixo em 1985. Lembro quando saiu esse disco e ele tirou todas as músicas! Ele ficava tocando o dia inteiro! O Ultraje sempre foi respeitado no meio do metal por causa das guitarras. Os guitarristas sempre foram virtuosos. Eles tinham um estilo sarcástico e desleixado. Esse álbum foi icônico. Quando entrei no Ultraje meu irmão ficou louco! Que plost twist! [risos]. Também gosto de Titãs e Blitz. Toquei com o Léo Jaime e conheci muito essas bandas. O próprio Léo tem músicas muito legais.

20 Abr 2023

Entrevista com Marcos Kleine (Ultraje a Rigor)

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