02/12/2022 às 22:02 Entrevistas

Entrevista com Ville Valo (ex-HIM, VV)

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Ville Valo é um dos maiores músicos da Finlândia e revolucionou o gothic metal com o HIM - banda que lançou seu álbum de estreia "Greatest Lovesongs Vol. 666" há exatos 25 anos.

Conversei com Ville Valo sobre seus tempos no HIM e também sobre "Neon Noir", disco de estreia de sua carreira solo, que se chama VV. Assista ao vídeo da entrevista no final da matéria!

Como você está nessa transição do HIM para carreira solo sob o nome VV?

Eu estou bem! Não componho um álbum há muito tempo, então é como voltar para essa vida novamente. Tive uma pausa de cinco anos! É empolgante e estranho, meus nervos estão a mil! São muitas emoções ao mesmo tempo.

Seu último álbum com o HIM foi o “Tears on Tape”, lá em 2013!

Foi quase 10 anos atrás! Já tem um bom tempo, né? Depois, fiz turnês com o HIM e por vários motivos resolvemos acabar com a banda. Sentimos que não conseguiríamos achar uma direção apropriada para ir. Somos muito amigos ainda e pensamos que seria melhor encerrar a banda com esse espírito, todos bem uns com os outros.

Isso foi em 2017, no Ano Novo. Decidimos encerrar esse capítulo. Depois, trabalhei em um projeto finlandês de um artista chamado ‘Agents’. Era tipo um som retrô dos anos 1950 e 1960, uma pegada bem oldschool e vintage. Fizemos um álbum em finlandês e tocamos algumas vezes. Isso foi entre 2018 e 2019. Logo depois, comecei a trabalhar no ‘Neon Noir’.

Levou um tempão para eu fazer esse disco! Nunca tinha feito um álbum tão demorado! Foi algo lento. O álbum é bom, mas a pandemia cobrou seu preço. Não tinha nenhuma gravadora disponível, precisei trabalhar bastante. Acho interessante esse conceito de ‘álbum solo’, já que realmente precisei fazer tudo sozinho! [risos]. Foi uma experiência especial. Eu queria buscar essa experiência diferente, especialmente depois do HIM. Lá foi uma história gigante, de 25 anos. Foi legal fazer algo completamente novo e desafiador. Essas foram as razões para essa pausa e meu retorno.

O novo álbum “Neon Noir” é conceitual? O que você pode dizer sobre os temas das letras?

Acho que é um momento de transição para mim. Como se transformar em uma mariposa ou borboleta. Uma ponte entre o HIM e o futuro. Sou eu tentando descobrir quem eu sou e isso foi muito divertido de descobrir, porque acabei seguindo o mesmo caminho musical. Tem muita similaridade com o HIM, é claramente uma continuação da mesma história.

Ainda uso o símbolo do heartagram, só que com uma modificação pequena para aparecer o ‘VV’, minhas iniciais. Agora, tematicamente, comecei a trabalhar música por música, foi um exercício de olhar para problemas existenciais. Quando comecei a trabalhar no disco, não sabia se eu ainda seria bom nisso [risos]. É normal entre músicos começar a sentir uma falta de confiança em si mesmo. Nunca tinha me encontrado nessa situação, mas resolvi colocar minha energia e esforço nisso.

A primeira música que surgiu foi ‘Run Away From The Sun’. Tematicamente, acho que é sobre saber quando persistir e quando abrir mão das coisas. Tanto na vida quanto no amor. É sobre encontrar significado durante a pandemia. O que você pode viver sem? No meu caso, não consigo viver sem música. Isso é meu bote salva vida. Foi importante e fico feliz de continuar cantando. Você nunca pode tomar isso como garantido e já contar que vai conseguir escrever um álbum.

Você definitivamente precisa deixar a inspiração te guiar. Tematicamente, tem essa atmosfera introspectiva e melancólica, como toda música que gosto de fazer. Tem uma coisa meio cinemática também. Acho que é menos agressiva que o HIM. Tem uma coisa mais alternativa e menos metal. É mais Queens of the Stone Age ou The Smashing Pumpkins do que Type O Negative. Se você olhar a produção, é por aí. Acho que é como um abraço caloroso de um vampiro! [risos].

Alguma dessas músicas foram inspiradas em experiências pessoais suas? São como metáforas?

Acho que tudo de certa forma é pessoal sim. Sou tipo um Rei ou Rainha do Drama, sei lá! Acho que grandes emoções combinadas, o fato de se cantar com o coração e o fato de se estar desesperado e lutando contra algo é importante no que diz respeito ao processo de compor. Então, as letras são um grande apanhado desses temas

Agora, tudo é muito real. Se você ler as letras, também brinco muito com as palavras. Gosto disso, não sei por quê. Gosto de brincar com os significados, talvez porque o inglês não é minha língua nativa. Me sinto como um forasteiro no que diz respeito a linguagem. Isso faz com que eu não me prenda muito. Não sou um escritor de ficção. Não funciona para mim assim. Acho que todos os escritores de ficção também se inspiram em experiências pessoais.

Isso fica até mais interessante, porque deixa de ser sobre mim. As histórias são mais interessantes quando contadas em terceira pessoa, sabe? Sempre fui fã de Neil Young e essas pessoas que são diretas no que dizem. Você vê a honestidade ali. Isso é importante.

Por falar em brincar com palavras, a música “Echolocate Your Love” traz esse termo da biologia – sobre comunicação de morcegos e golfinhos! De onde você tirou essa ideia?

Achei que daria um belo título de música! É uma pegada meio gótico inglês dos anos 1980. Não necessariamente Bauhaus, mas algo assim. Eu amo morcego! Eu estava assistindo um documentário sobre como eles se comunicam e navegam. Comecei a pensar em navegar no escuro. Metaforicamente falando, encontramos melhor o que estamos buscando quando nossos olhos estão fechados. Quando estamos no escuro, confiamos nos nossos instintos e no nosso coração. O cérebro desliga e isso funciona.

Essas coisas que estavam na minha cabeça quando escrevi essa música. Esse lance da ecolocalização entra aí. É sobre confiar no seu instinto e no seu coração e não acreditar no que os outros dizem. É uma coisa meio juvenil e punk se você parar para pensar. É minha maneira de interpretar essa emoção.

Você sempre compôs sobre amor e morte. Quando esse interesse por esses temas começou na sua vida?

Muita literatura, cinema e música da Finlândia fala sobre esses temas. Não necessariamente depressivo, mas bastante sombrio. Acho que amor e morte são temas sim dessa expressão cultural. Eros e Thanatos. Alfa e Ômega. É uma combinação interessante e inspiradora. É bastante assustadora, mas também emocionante. Ao mesmo tempo, amor e morte são temas fascinantes.

São como algo que você sabe que não deve olhar, mas não consegue desviar a cabeça. Quando comecei a compor, ouvia muito bandas como My Dying Bride, Paradise Lost, Anathema e Type O Negative. Também coisas dos anos 1980, como The Sisters of Mercy e Fields of the Nephilim. Eu estava aprendendo minha própria maneira de me comunicar através das minhas músicas. O Black Sabbath e o Depeche Mode também foram inspirações. No caso do Depeche, as letras são bem particulares.

Eu não vim de uma família de falantes de inglês, então precisei aprender como as palavras soam. Isso sempre foi muito interessante para mim. A luz no escuro. O ying e o yang. E o Neon com o Noir. Isso sempre me perseguiu. Me encontro em algum lugar no meio desses extremos. É minha zona de conforto. Eu gosto de um pouco desse drama. As coisas precisam ser sentidas. Se não doer, não é bom [risos].

Já se passaram 25 anos desde o lançamento de “Greatest Love Songs Vol. 666” (1997), o primeiro álbum do HIM. Quais memórias você tem desse período?

Nós havíamos feito uma demo e um EP no ano anterior, foi algo bem rápido. Começamos a fazer nossos primeiros shows, mas não fizemos uma turnê propriamente dita. Não sabíamos como isso funcionava. Naquela época, as pessoas achavam que se você é uma banda finlandesa tocando metal em inglês não ia ter chances de sucesso e estaria condenado. Não ouvimos essas pessoas e continuamos.

Acho que a coisa especial sobre esse primeiro álbum é que não sabíamos nada sobre gravação ou compor. Essa ingenuidade era como se fôssemos virgens. Nosso produtor Hiili Hiilesmaa nos pegou pela mão e disse para não ter medo dos extremos. Podemos fazer coisas loucas com timbres de guitarra e ir fundo na atmosfera. Foi um ótimo começo. Não havia pressão da gravadora. A pressão veio depois. Foi o começo, me lembro muito bem de fazer esse disco.

Agora, pensando nas músicas, temos ‘When Love And Death Embrace’, que é minha música favorita que já compus. Ainda tocamos e ano que vem na turnê solo vai estar no setlist. É engraçado como a música viaja e cantar uma música que compus 25 anos atrás ainda funciona. A emoção ainda é crua e significa muito para mim. Não é sobre nostalgia, é como se fosse algo presente. Eu nunca mais tinha ouvido esse disco e voltei a ouvir agora que lançamos uma versão especial em vinil.

A música com mais streamings do HIM no Spotify é “Wings of a Butterfly”. Quais memórias você tem dessa composição? Por que acha que é a mais querida dos fãs na plataforma?

Acho que foi fruto de uma época. Não acho que o sucesso tem a ver só com a música em si e sim com o momento que surgiu. Nesse caso, lembro que estávamos conseguindo atrair um público grande no Reino Unido por causa do sucesso do álbum ‘Love Metal’. Fizemos uma turnê por lá pela primeira vez.

Então, fiquei muito amigo do Bam Margera, do Jackass. Ele começou a falar sobre nós nos EUA e usou nossa música nos vídeos loucos dele. Aos poucos, conseguimos uma turnê por lá pela primeira vez. Foi aí que tudo começou a acontecer. Estávamos em alta quando começamos a compor o ‘Dark Light’, que é onde está ‘Wings of a Butterfly’. Gravamos em Silver Lake e o produtor foi o mesmo desse meu disco novo ‘Neon Noir’.

Essa foi uma das músicas do álbum e não achamos que ia ser um sucesso. O timing foi ótimo e tocou bastante na MTV dos EUA. Foi algo bom.

Na história do HIM, é engraçado porque uma música como ‘Join Me In Death’, por exemplo, foi enorme na Europa e nos rotulou como uma banda crossover. Aparecemos em revistas pop, o que foi estranho demais! Nossa história é estranha, fomos de sensação da música pop até o lado mais gótico e tudo entre isso.

A Finlândia é conhecida por ter muitas bandas de metal de sucesso, como Nightwish, Stratovarius e Children of Bodom. Como é sua relação com elas?

No caso do Children of Bodom, infelizmente eles acabaram depois da morte do Alex Laiho. Eu encontrei todas essas bandas. O Nightwish, por exemplo, eles não são de Helsinque e o gênero deles é um pouco diferente. Então, não tivemos a chance de tocar nos mesmos festivais. Nós tocávamos em festivais de rock e eles no Wacken, nesses eventos bem de metal.

O Stratovarius estava na cena desde antes de nós e foram os primeiros da Finlândia a fazer turnê na América do Sul. Isso foi legal. Acho que temos muitas bandas de metal porque bater cabeça é algo que nos esquenta! [risos]. Aqui fica muito frio no inverno! Esse é o motivo! Acho que é por isso que as bandas norueguesas queimam igrejas. Não tem nada a ver com satanismo. É porque é frio! [risos].

Você é famoso pela qualidade da sua música no HIM, mas também por ser um cara bonitão. Como você lida com isso? É tranquilo o rótulo de galã?

Você precisa culpar meus pais pela minha genética! [risos]. Quando comecei a ouvir música, me apaixonei por bandas como Kiss, Iron Maiden e W.A.S.P., bandas que são o pacote completo. Tem a coisa da música, mas também a imagem, arte da capa. Tudo isso junto. É legal se você puder construir seu próprio mundo e convidar as pessoas para se juntar a isso. O Iron Maiden é ótimo nisso, se você pensar no Eddie e nas artes das capas. Eles são o J. R. R. Tolkien do metal. Eles construíram uma terra própria.

Nesse sentido, o que tento fazer é que minha imagem pessoal tenha a ver com a música que eu toco. É como se a música soasse da maneira que eu me visto. Nunca quis criar uma personalidade diferente tipo como faz o Alice Cooper – que é como uma persona separada dele. Para mim, sempre foi importante ser quem você é. Uma coisa honesta. Mas fico lisonjeado que as pessoas me considerem atraente, mas isso por si só não faz com que a música seja boa!

Você nunca foi um cara de ficar nas redes sociais, como Instagram e Facebook. Não curte muito esse tipo de coisa?

Eu sou oldschool e acredito na imaginação. Gosto das coisas que dão asas para a imaginação. No mundo da música, hoje em dia tem muita informação. Os músicos deixam que as pessoas saibam demais sobre eles. Toda informação é fragmentada. Não estou interessado em contar para as pessoas o que tomei de café da manhã! [risos]. Isso de tirar foto da mesa e tal. Não é uma forma de comunicar que me sinto confortável.

A gravadora faz esse trabalho de se comunicar pelas redes sociais em nome da minha banda. Eu sempre gostei de artistas que são mais misteriosos. Esse aspecto de isolamento. Para mim, enquanto ouvinte, faz com que minha imaginação seja impulsionada. Quando você começa a imaginar e criar ideias sobre um artista, isso é muito mais poderoso, especial e único do que essa informação constante bombardeada nas redes sociais.

Eu entendo o poder que a internet tem. As pessoas podem se comunicar mesmo distantes. É uma ótima maneira de fazer isso. Mas não me sinto muito confortável e não tenho muito o que dizer. Acho que facilmente isso vira um jogo. Você começa e não consegue parar. É melhor se eu ficar fora disso, não quero acordar no meio da noite e ficar escrevendo textões em caps lock. Isso é o que eu provavelmente faria!

Quais são os cinco álbuns mais importantes da sua vida e por quê?

Vamos pensar. São muitos gêneros, né? Acho que ‘Bloody Kisses’, do Type O Negative. Eles me mostraram como combinar um senso de humor mais sombrio com letras emotivas. Musicalmente, combinavam luz e sombra. Isso foi muito especial e funcionou como uma planta para o HIM. Não queríamos copiar, mas claro que ficamos impressionados e inspirados.

Antes disso, diria ‘Black Sabbath’, do Black Sabbath. Eles eram de famílias de trabalhadores, de uma cidade de trabalhadores, sem glamour nem nada. Eram caras durões e o que fizeram ainda ressoa hoje. É um álbum muito especial, eles começaram um gênero. São fonte constante de inspiração desde o começo até hoje.

O terceiro seria ‘Somewhere In Time’, do Iron Maiden. Quando eles fizeram a turnê, chamaram de ‘Somewhere on Tour’. Há há! Eles tocaram em Helsinque com o W.A.S.P. de abertura. Foi o primeiro show que fui na vida. Acho que foi em novembro de 1986. Eu ainda tenho a camiseta que fui! Deve estar cheia de buracos e não deve caber mais. Foi o começo de uma coisa para mim. Ver o Eddie robô no palco foi surreal. Um grande show típico dos anos 1980.

Diria também o ‘Violate’, do Depeche Mode. Eles têm muitos álbuns bons, mas a música ‘Enjoy the Silence’ fez um impacto enorme. Tanto musicalmente quanto na letra. Não ouvi o disco quando ele saiu, e sim depois um pouco. As músicas soam de maneira simples, mas na verdade têm uma profundidade grande. As letras enviam sinais misturados, eles não são sempre claros no que dizem. Sou um grande fã desse estilo de composição. Foi quando comecei a voar para fora do metal e ouvir outras coisas.

Por fim, talvez algo do My Dying Bride. O disco de estreia ‘As The Flower Withers’ foi maravilhoso quando saiu. Amo também o ‘Turn Loose The Swans’ e o ‘The Angel and the Dark River’. Lembro que a MTV tinha um programa de metal chamado Headbangers Ball e era o único lugar que você podia ouvir coisas como Morbid Angel, Carcass, black metal etc. Lembro de ver o My Dying Bride lá. Foi engraçado e assustador ao mesmo tempo. Sou um grande fã deles e amo o estilo doom.

02 Dez 2022

Entrevista com Ville Valo (ex-HIM, VV)

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